Ano 25 – Número 29 – 24 de julho de 2023

Informe Econômico

Brasil: breve balanço do primeiro semestre e atualização de projeções para 2023

No final do ano passado, as expectativas para a economia brasileira em 2023 não eram muito otimistas, principalmente por conta da desaceleração da atividade em curso devido às condições financeiras apertadas (inflação e juros altos no mercado interno e externo) e das incertezas inerentes ao início do novo ciclo político. No entanto, após um semestre marcado por muita volatilidade, os dados divulgados até então retratam um cenário ainda difícil, mas relativamente mais promissor na ótica de algumas variáveis relevantes.

A inflação, por exemplo, entrou em trajetória consistente de queda, com melhora na evolução dos componentes mais sensíveis ao ciclo econômico (núcleos e inflação de serviços), bem como recentemente houve reversão parcial da desancoragem das expectativas para os próximos anos. Como consequência, as apostas para o início dos cortes da taxa de juros foram sendo antecipadas. Dadas as condições do momento, é muito provável que a taxa Selic comece a ser reduzida já na próxima semana.

O impacto dos juros altos nas condições de crédito foi um dos maiores entraves ao desempenho dos negócios, penalizando principalmente a atividade industrial e a confiança dos empresários. O crescimento acima do esperado no PIB do primeiro trimestre foi puxado pela Agropecuária, devido à safra recorde de grãos. A expansão fiscal e a redução da inflação repercutiram positivamente na demanda das famílias, com reflexo nos Serviços, que mantiveram o mercado de trabalho aquecido.

Quanto ao mercado externo, a valorização do Real em relação ao Dólar deu-se por duas vias principais: melhora da posição brasileira frente aos seus pares e o aumento da taxa de juros real. As exportações, por sua vez, avançaram em linha com a evolução relativamente positiva da conjuntura internacional, com a maior demanda por bens agrícolas sendo a principal fonte de crescimento, que mostrou parceiros comerciais mais resilientes do que o esperado. Aliado a isso, é importante frisar que a dinâmica das importações brasileiras diminuiu mais do que as expectativas apontavam.

Nos tópicos abaixo, as principais variáveis da economia brasileira são abordadas de forma sucinta: atividade econômica (PIB e mercado de trabalho), taxa de câmbio, balança comercial, inflação, taxa de juros e contas públicas. Resumem-se os principais acontecimentos do semestre, bem como são atualizadas as projeções para o fechamento de 2023. A tabela no final do documento contém os dados completos. Na próxima semana serão apresentadas as revisões do cenário econômico do Rio Grande do Sul.
PIB: Agropecuária forte e baixo desempenho da Indústria deve ser o destaque em 2023

O PIB brasileiro deve crescer 2,0% em 2023, o dobro do projetado em dezembro de 2022 (+1,0%). A revisão decorre principalmente da surpresa positiva na leitura do primeiro trimestre. O desempenho da Agropecuária (+18,8% na comparação com o 1º trimestre de 2022), resultado da boa safra de grãos, foi o que impulsionou o PIB no início do ano. O setor deve fechar 2023 com crescimento de 11,0%, ante nossa expectativa de 3,0%.

Ao longo dos próximos trimestres, esperamos uma desaceleração na margem da atividade brasileira, pois a contabilização da produção agrícola ocorre principalmente no primeiro trimestre. Além disso, a atual conjuntura de juros elevados e baixa confiança dos empresários deve continuar impactando os números da Indústria, que deve encerrar 2023 com crescimento de apenas 0,8% (em dez/22 nossa expectativa era de um crescimento de 1,0%).

Por outro lado, a elevação do gasto público, sobremaneira, o aumento do salário-mínimo no segundo trimestre do ano, bem como a resiliência do mercado de trabalho e aumento da renda real das famílias, deve colaborar com o crescimento esperado de 1,4% do setor de Serviços (ante nossa expectativa de 0,8% em dez/22).

Mercado de trabalho: geração de empregos resiliente e taxa de desemprego distorcida

O mercado de trabalho apresentou uma desaceleração menos intensa do que a esperada, dado o estágio do ciclo econômico e o aperto monetário em curso. A melhora da renda disponível em função da expansão fiscal e da redução da inflação acima do esperado, bem como a continuidade de bons números no setor de serviços, ajudam a explicar os resultados.

Nos cinco primeiros meses do ano, o Brasil gerou 865 mil empregos com carteira assinada, fazendo o acumulado em 12 meses cair de 2 milhões em dezembro de 2022 para 1,8 milhão em maio de 2023. Com os resultados observados até o momento e o maior crescimento da economia, revisamos nossa projeção para a geração de empregos em 2023 para 1,3 milhão de postos de trabalho, ante perspectiva de 550 mil no Balanço Econômico em dezembro do ano passado.

A taxa de desemprego, que fechou 2022 em 7,9% da força de trabalho, seguiu o movimento sazonal de elevação até março, chegando a 8,8%, e caiu nos meses seguintes, atingindo 8,3% em maio, o último dado disponível. Contudo, é importante destacar que um grande contingente de pessoas deixou o mercado de trabalho, conforme abordamos nos Informes nº 15 e nº 21 deste ano, o que segurou a taxa de desemprego. Caso essas pessoas voltassem a procurar emprego, a taxa de desemprego seria de 11,3% atualmente. Em função do movimento de saída das pessoas do mercado de trabalho e da melhor perspectiva para a atividade econômica, revisamos nossa projeção para a taxa de desemprego no final de 2023 para 7,3%, com média anual de 7,9%. No final do ano passado, as projeções eram de 8,5% e 8,8%, respectivamente.

Taxa de câmbio: melhora na perspectiva ante pares

No início do ano, nossas projeções eram de uma taxa de câmbio rondando os R$ 5,30/US$ no final de 2023. As perspectivas baseavam-se em uma taxa de inflação mais resiliente, de modo às taxas de juros reais brasileiras permanecerem mais baixas por mais tempo. Ao final do primeiro semestre, o que temos é uma taxa de juros real maior e a expectativa de inflação mostrou-se mais comportada nos últimos meses, apontando uma maior atratividade do Real.

Em termos comparativos, o Brasil aparece mais bem posicionado ante seus pares. A Argentina, por exemplo, passa por uma nova crise com o FMI, a Rússia permanece imersa em um conflito militar, a China enfrenta problemas de crescimento e de regulação – em especial o relacionado ao mercado imobiliário e ao sistema educacional –, o Chile enfrenta desafios com relação à votação de uma nova Constituição e, por fim, a Turquia lida com Erdogan por mais alguns anos à frente do Palácio Branco. Esses fatores, aliados à maior demanda por exportações da economia brasileira, principalmente a de produtos agropecuários, nos levam a reavaliar nossa projeção cambial para R$ 4,95/US$ para o final de 2023.

Balança comercial: mercado interno menos aquecido com melhores perspectivas para o externo

Quanto à Balança Comercial, esperávamos um mercado externo menos aquecido inicialmente. O inverno europeu não foi tão rigoroso quanto o esperado, pondo menos pressão nas cadeias de suprimentos, a espiral-preços salários não se concretizou nos EUA e a estiagem que se abateu sobre a Argentina contribuiu para a soja brasileira. A demanda externa, portanto, mostrou-se mais resiliente do que o incialmente esperado. As exportações brasileiras apresentaram avanço de 1% frente ao mesmo semestre do ano passado. Vale ressaltar que a Agropecuária (+6,8%) foi o setor preponderante para explicar o avanço. Pelo lado das importações, com o mercado interno menos aquecido, houve queda de 7,1% frente ao primeiro semestre do ano passado, principalmente por conta da menor demanda industrial.

Como resultado, aumentou o que esperávamos para o saldo da Balança Comercial, dadas maiores exportações do que inicialmente estávamos projetando e menores importações. Desse modo, nossa projeção avançou de um superávit de US$ 56 bi para US$ 64,5 bi no final de 2023.

Inflação: melhora dos números em 2023, mas ainda longe do centro da meta de inflação

No final do ano passado, esperávamos que o IPCA fecharia 2023 em 5,2%. No entanto, a dinâmica dos preços durante esses primeiros seis meses tem se mostrado mais positiva do que o esperado. A boa safra no Centro-Oeste do país, aliada à dinâmica de redução dos preços das commodities, tem refletido no preço dos alimentos, que acumula alta de apenas 0,1% no ano (nesse mesmo período do ano passado, os alimentos acumulavam alta de 10,2%). Sobre essa mesma tendência estão os preços dos Bens industriais que, devido à normalização das cadeias globais de suprimentos e commodities, estão em processo de retração. Se olharmos a dinâmica do Índice de Preços ao Atacado (IPA) produzido pela FGV, que reflete os custos de produção, atualmente, ele acumula deflação de 7,0% no ano.

Em razão dos cortes nos preços de combustíveis executados pela Petrobras, os quais mais do que compensaram os efeitos altistas da reoneração dos impostos federais e da mudança de cálculo do ICMS, as surpresas do ano têm ficado no campo dos Monitorados. Todavia, o desafio desde o ano passado segue sendo a inflação de Serviços, que permanece resiliente, com alta de 3,4% em 2023, e dos núcleos de inflação, que estão em 6,2% no acumulado em 12 meses, muito acima da meta de 3,25%, ainda que em trajetória de queda.

Sob esse cenário, nossa atual projeção para o IPCA de 2023 é de 4,8%. Há riscos de baixa pelos reflexos da valorização do Real e do efeito defasado da política monetária contracionista. No entanto, pelo lado altista, os impactos do El Ñino que elevam o volume de chuvas, principalmente, no Sul do Brasil, devem ser um desafio sobre os preços dos alimentos e os custos da energia (caso as chuvas não ocorram com frequência no Sudeste do país, onde estão as maiores plantas geradoras de energia; contudo, esta é uma preocupação mais para 2024, dados os níveis atuais dos reservatórios).

Com relação ao INPC, nossa expectativa é que encerre 2023 em 4,6%, ante projeção de 5,4% em dezembro de 2022. Quanto ao IGP-M projetamos que, no acumulado desse ano, haja uma deflação de 2,7%, ante expectativa de inflação de 4,5% feita no final do ano passado. Essa redução nas projeções do famoso “índice de reajuste do aluguel” é resultado da queda dos preços das commodities, que impactou um dos seus principais componentes: o Índice de Preços ao Atacado (IPA).

Selic: início do ciclo de cortes deve ser com parcimônia

A expansão fiscal promovida no início do ano, aliada às incertezas quanto ao futuro das contas públicas brasileiras, trouxeram maior pessimismo quanto ao início do processo de corte de juros. Em dezembro do ano passado, projetávamos Selic estável até o final de 2023. No entanto, ao longo do semestre, a tramitação do Marco Fiscal, a redução de itens mais voláteis do IPCA, a valorização do Real e a atividade econômica em processo de arrefecimento, permitiram vislumbrar, ainda que de maneira tímida, o início da reancoragem das expectativas de inflação e, consequentemente, avistar o início do ciclo de cortes da taxa.

Na ata da última reunião, o COPOM sinalizou a possibilidade de iniciar a queda de juros em agosto, ainda que de forma parcimoniosa. Após a avaliação do processo de desinflação e a consolidação da redução das expectativas – reforçada pelo compromisso do Governo Federal com a meta de inflação – acreditamos que o comitê terá fortes incentivos a reduzir os juros em 0,25 p.p. na próxima reunião e 0,50 p.p nas demais do ano, fechando 2023 com a Selic em 12,00%.

Contas públicas: muito gasto para pouca receita

Em 2023, o Setor Público Consolidado deve fechar o ano com déficit de 1,2% do PIB. A melhora do indicador com relação ao que esperávamos no início desse ano (chegamos a projetar déficit de 1,4% do PIB em fev/23), está diretamente relacionada à melhora das expectativas sobre o PIB, denominador da razão. Nos últimos seis meses, o Governo Federal promulgou uma série de medidas visando o aumento do gasto público (manutenção do Auxílio Brasil em R$ 600, aumento do salário-mínimo, relançamento do Minha Casa Minha Vida, reajuste do funcionalismo público, aumento de bolsas para estudantes, fortalecimento do Farmácia Popular, etc) e, em contrapartida, teve de assegurar o fortalecimento das receitas (reoneração de impostos federais, programa de renegociação de dívidas tributárias, alteração do funcionamento do Carf, etc). Dos primeiros cinco meses do ano, em dois deles o Governo Federal sofreu déficit em seu caixa.

Dois fatos podem vir a contrabalancear o número negativo do ano. Primeiramente, as contas públicas estaduais que, devido à mudança na forma de cobrança do ICMS sobre os combustíveis, de ad valorem para ad rem, terão seus caixas aumentados, resultado melhor dado o cenário da PEC dos Combustíveis de 2022. Em segundo, ainda não se sabe o efeito sobre a arrecadação da renegociação de dívidas tributárias das empresas, que podem colaborar para reduzir o quadro deficitário. De forma geral, projetamos o aumento da dívida bruta de 72,9% do PIB em 2022 para 74,3% do PIB em 2023. Vale destacar que a dinâmica das contas públicas para os próximos anos dependerá do desempenho do novo Marco Fiscal e da aprovação da reforma tributária, importantes avanços estruturais que poderão impulsionar o crescimento econômico do país.

DADOS E PROJEÇÕES PARA A ECONOMIA BRASILEIRA

Produto Interno Bruto1

20192020202120222023*
Agropecuária0,44,20,3-1,711,0
Indústria-0,7-3,04,81,60,8
Serviços1,5-3,75,24,21,4
TOTAL1,2-3,35,02,92,0
1O PIB Total é projetado a preços de mercado; os PIBs Setoriais são projetados a valor adicionado. *Projeção UEE/FIERGS.

Produto Interno Bruto Real (Em trilhões correntes)

20192020202120222023*
Em R$7,3897,6108,8999,91510,599
Em US$21,8731,4761,6491,9202,119
2Taxa de câmbio média anual utilizada para o cálculo e IPCA utilizado como inflação. *Projeção UEE/FIERGS.

Inflação (% a.a.)

20192020202120222023*
IGP-M 7,323,117,85,5-2,7
INPC4,55,410,25,94,6
IPCA4,34,510,15,84,8
*Projeção UEE/FIERGS.

Produção Física Industrial (% a.a.)

20192020202120222023*
Extrativa Mineral-9,7-3,41,0-3,24,6
Transformação0,2-4,64,3-0,40,0
Indústria Total3-1,1-4,53,9-0,70,5
3Não considera a Construção Civil e o SIUP. *Projeção UEE/FIERGS.

Empregos Gerados – Mercado Formal (Mil vínculos)

20192020202120222023*
Agropecuária13371466435
Indústria97149719442299
Indústria de Transformação1348439215147
Construção7197245193134
Extrativa e SIUP4133363519
Serviços534-3781.9121.515941
TOTAL644-1932.7782.0211.276
4SIUP = Serviços Industriais de Utilidade Pública. *Projeção UEE/FIERGS.

Taxa de desemprego (%)

20192020202120222023*
Fim do ano11,114,211,17,97,3
Média do ano12,013,89,37,97,6
*Projeção UEE/FIERGS.

Setor Externo (US$ bilhões)

20192020202120222023*
Exportações221,1209,2280,8334,5304,0
Importações185,9158,8219,4272,7239,5
Balança Comercial35,250,461,461,864,5
*Projeção UEE/FIERGS.

Moeda e Juros

20192020202120222023*
Meta da taxa Selic – Fim do ano (% a.a.)4,502,009,2513,7512,00
Taxa de Câmbio – Desvalorização (%)54,028,97,4-6,5-5,2
Taxa de Câmbio – Final do período (R$/US$)4,035,205,585,224,95
5Variação em relação ao final do período anterior. *Projeção UEE/FIERGS.

Setor Público (% do PIB)

20192020202120222023*
Resultado Primário-0,8-9,20,71,3-1,2
Juros Nominais-5,0-4,1-5,0-5,9-6,0
Resultado Nominal-5,8-13,3-4,3-4,6-7,2
Dívida Líquida do Setor Público54,761,455,857,161,0
Dívida Bruta do Governo Geral74,486,978,372,374,3
*Projeção UEE/FIERGS.
Informações sobre as atualizações das projeções:
Economia Brasileira: Todas as variáveis econômicas foram atualizadas.
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Observatório da Indústria do Rio Grande do Sul

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