Cenário Mundial – Em 2023, os cenários econômicos brasileiro e internacional se revelaram complexos. O crescimento ao redor do mundo enfrenta desafios devido ao aumento nas taxas de juros, ainda decorrentes das políticas monetárias e fiscais utilizadas para atenuar os efeitos da pandemia da COVID-19. Essas políticas trouxeram consigo inflação elevada, endividamento alto, aperto monetário e pressão salarial. O crescimento econômico global deve fechar 2023 em 3%, abaixo dos 3,5% verificados no ano anterior, de acordo com o FMI. Diversos fatores contribuem para a construção deste quadro de desaceleração global e de aumento das incertezas, incluindo a dinâmica das taxas de juros nos Estados Unidos, conflitos geopolíticos, como as guerras na Europa e no Oriente Médio, o ritmo de crescimento da China, as mudanças políticas na Argentina e a volatilidade nos preços do petróleo no mercado internacional.
Cenário Nacional – No Brasil, o ano de 2023 novamente foi de surpresas positivas para a economia. A projeção de alta para o PIB neste ano, que era de 1% no final de 2022, deve se confirmar em 2,8%. A atividade econômica foi impulsionada pela expansão expressiva da Agropecuária, dos Serviços e da Indústria Extrativa. A Agropecuária repercutiu a safra recorde de grãos, enquanto os Serviços mostraram resiliência com o aumento da renda disponível por conta do impulso fiscal, da redução da inflação e de um mercado de trabalho ainda aquecido. Entretanto, a Indústria de Transformação ficou praticamente estagnada devido à queda dos investimentos, o que é preocupante para o médio e longo prazos. Dadas todas as deficiências de infraestrutura e um mundo onde as mudanças tecnológicas acontecem cada vez de forma mais acelerada, a redução nos investimentos se mostra um fator preocupante para o futuro do País.
O investimento acontece quando as condições financeiras estão favoráveis, em especial o crédito, mas também se há confiança em perspectivas promissoras. Em 2023, os dois elementos se mostraram prejudicados. Desde a definição das eleições no final do ano passado, uma série de incertezas se instalaram, em especial dúvidas de como o novo Governo Federal trataria as contas públicas e como seria a sua postura em relação às Reformas que melhoraram o ambiente de negócios no Brasil nos últimos anos. A última ata do Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom) ressalta elevados níveis de incerteza no cenário econômico. A palavra “incerteza” e seus derivados foram citados 12 vezes no relatório, o maior número registrado entre as 38 atas sob a gestão de Roberto Campos Neto.
Nesse contexto, a política monetária, no ano de 2023, foi marcada pelo início do ciclo de cortes da taxa básica de juros (Selic), após um ano no patamar de 13,75%. A decisão foi motivada pela redução da inflação corrente e das expectativas em torno de uma redução futura do patamar inflacionário, bem como por sinais de que a política monetária estava impactando negativamente a economia. O IPCA deve fechar 2023 com alta de 4,1% e a Selic em 11,75%. Embora a postura sóbria do Banco Central brasileiro tenha jogado a favor de uma apreciação cambial durante o ano, o aumento do diferencial de juros, a estabilização da taxa de juros nos EUA, e a queda da Selic no Brasil deverão pressionar a taxa para cima no próximo ano. Nossas estimativas apontam para a taxa de câmbio encerrando 2023 em R$ 5,00/US$ e em R$ 5,08/US$ ao final de 2024, ou seja, praticamente estável.
No âmbito da política fiscal, antes mesmo de começar 2023, uma PEC que permitiu um gasto adicional de R$ 145 bilhões foi aprovada e com ela o fim do Teto de Gastos, instituído em 2016 que colocou as contas públicas em ordem, fez o Brasil voltar a ter superávit primário, controlar a dívida pública e abriu espaço para juros estruturais mais baixos. Em seu lugar, foi aprovado o chamado Novo Arcabouço Fiscal, que permite crescimento real dos gastos, mesmo em períodos de baixa arrecadação, e que requer o aumento de receitas para sua sustentação. Como consequência, as contas do Setor Público Consolidado registraram resultado negativo após dois anos de superávit, com destaque para o déficit de R$ 95,5 bilhões nos primeiros nove meses de 2023. Reduções na arrecadação decorrente da exploração de recursos naturais, desonerações tributárias e mudanças nas diretrizes das Estatais impactaram as receitas, enquanto o aumento das despesas obrigatórias contribuiu para o déficit. A Dívida Bruta do Governo Geral atingiu 74,4% do PIB em setembro de 2023, refletindo o cenário de dificuldades da União em atingir as metas fiscais estabelecidas.
No mercado de trabalho, o panorama geral aponta para uma desaceleração na recuperação do emprego e renda em 2023, com uma notável queda no desemprego, mas que foi severamente influenciada pela saída de trabalhadores do mercado. Para 2024, é esperada a geração de 956 mil novos postos de trabalho no Brasil, uma redução em relação aos 1,5 milhão de empregos gerados em 2023.
Nesse cenário, as expectativas para 2024 são de desaceleração no crescimento do PIB, com a economia brasileira avançando num ritmo de 1,5%, com desafios previstos em vários setores. A Agropecuária pode sofrer devido à projeção de queda na safra de grãos, o setor de Serviços será impactado pela desaceleração do mercado de trabalho, e a Indústria enfrentará desafios devido a juros ainda elevados e um cenário internacional adverso. Mudanças positivas no sistema tributário podem impulsionar investimentos, mas no longo prazo. Além disso, o campo fiscal segue sendo fonte de incerteza. O Governo criou o Novo Arcabouço Fiscal e, provavelmente, a meta de déficit zero não será cumprida já no primeiro ano de vigência. Estimamos déficit primário de 1,2% do PIB em 2024.
Cenário Estadual – Na economia do Rio do Grande do Sul também houve surpresas, mas pelo lado negativo. A boa safra de grãos esperada para 2023 sofreu os impactos da estiagem no início do ano. Contudo, devido à seca ter sido menos intensa que a verificada no ano anterior, a Agropecuária deve apresentar crescimento expressivo. A Indústria teve reflexos de uma conjuntura desfavorável que combinou juros altos e baixa confiança dos empresários. A produção industrial gaúcha registrou uma queda de 5,1% no acumulado do ano até setembro de 2023, contrastando com a estabilidade observada no Brasil como um todo. Os segmentos de Refino de Petróleo e Biocombustíveis, Produtos de Metal e Máquinas e Equipamentos apresentaram os maiores impactos negativos no resultado. Os empresários industriais gaúchos destacaram a demanda interna insuficiente, a alta carga tributária e os juros como principais fatores para o resultado negativo observado. A baixa confiança empresarial ao longo de 2023 refletiu incertezas sobre fundamentos econômicos, especialmente âmbito fiscal. Assim, as projeções iniciais de expansão da produção não se concretizaram como esperado e os reflexos negativos também foram observados nas exportações. Além disso, a chegada do El Niño trouxe prejuízos para toda a economia no segundo semestre. Em sentido contrário, assim como no Brasil, os Serviços mantiveram um bom ritmo de alta. Devido a esses fatores, o avanço projetado para o PIB gaúcho em 2023 é de 2,5%, metade da taxa de 5% esperada no final do ano passado.
Quanto ao emprego no Estado, a taxa de participação, que mede a proporção de pessoas em idade de trabalhar na força de trabalho, ainda está abaixo dos níveis pré-pandemia. Ainda assim, a queda simultânea na força de trabalho e na população desocupada mantiveram a taxa de desocupação em patamares baixos no terceiro trimestre de 2023. A projeção para 2023 aponta uma taxa de desemprego de 5%, semelhante à prevista para 2024. Setores intensivos em mão de obra, como a Indústria de Transformação, continuarão enfrentando desafios devido à escassez de trabalhadores. Nossas projeções indicam a criação de cerca de 21 mil novos empregos em 2024 no Rio Grande do Sul, após a criação de 41 mil vagas em 2023.
No que diz respeito às contas públicas gaúchas, o Estado registrou um superávit de R$ 6,3 bilhões nos primeiros oito meses de 2023, com um crescimento de 10,8% na receita total efetiva em relação ao mesmo período do ano anterior, impulsionado por privatizações, especialmente da Corsan. No entanto, a queda na arrecadação de ICMS impactou as receitas correntes, enquanto as despesas efetivas aumentaram, principalmente em Pessoal e Encargos. Desafios adicionais serão observados na arrecadação de ICMS com o aumento proposto da alíquota modal por conta de seus impactos negativos no consumo e competitividade.
Para 2024, após enfrentar dois anos de estiagem devido aos efeitos do fenômeno La Niña, os prognósticos da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) indicam que a safra de grãos gaúcha atingirá um recorde de 40 milhões de toneladas em 2024, representando um expressivo aumento de 39,4% em comparação com 2023. Os ciclos econômicos no Rio Grande do Sul estão intimamente vinculados à produção agrícola, dada a sua interconexão com vários segmentos industriais e de serviços. Entretanto, é crucial ressaltar os efeitos do clima. O fenômeno El Niño já está causando danos, com o excesso de chuvas ocasionando atrasos no plantio das culturas de verão, o que pode comprometer a produtividade.
A melhor produção agrícola poderá ter impactos positivos nos segmentos industriais correlatos. Além disso, prevê-se que, devido à significativa retração que deverá ser confirmada ao final de 2023, a Indústria gaúcha apresente uma recuperação em 2024, embora não seja suficiente para compensar as perdas anteriores. Vale ressaltar que desafios como instabilidade fiscal, possível aumento de impostos e baixa confiança empresarial continuam no horizonte e podem afetar negativamente. Em paralelo, o setor de Serviços tende a manter seu crescimento, porém com uma taxa mais moderada, alinhada à desaceleração na geração de empregos.
Levando tudo isso em conta, nossa expectativa é de um crescimento de 4,7% no PIB do Rio Grande do Sul em 2024, taxa que leva em conta uma forte elevação da Agropecuária (+37,1%), avanço na Indústria (+1,8%) e nos Serviços (+1,5%). Mesmo com o desempenho expressivo esperado para o próximo ano, a alta resulta em um PIB apenas 1,8% acima do nível de 2021, o equivalente a crescer a uma média de 0,6% no período de três anos. No caso da Indústria gaúcha, fazendo a mesma comparação, o setor deve chegar ao final de 2024 ainda 1% abaixo do PIB industrial de 2021, o que equivale a cair em média 0,3% ao ano no triênio.
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